Apesar da recente decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de manter a taxa básica de juros, a Selic, em 15%, conforme as expectativas do mercado, e o consequente destaque das aplicações de renda fixa, o mercado acionário brasileiro surpreendeu investidores com oportunidades de rendimento acima deste patamar. Um levantamento minucioso revelou que um conjunto específico de ações com dividendos acima da Selic em um período de 12 meses, oferecendo um retorno consideravelmente atrativo e instigando um olhar estratégico sobre a bolsa.
Empresas de diversos segmentos e portes, que englobam desde tecnologia e bens de consumo até setores de energia e imobiliário, apresentaram rendimentos em proventos capazes de superar os juros vigentes. Essa performance notável demonstra que, mesmo em um cenário de alta rentabilidade da renda fixa, a seletividade e a análise aprofundada podem revelar verdadeiras joias no universo das ações.
Ações com Dividendos Acima da Selic Desafiam Renda Fixa
Os dados, compilados pela Economática e divulgados pela Infomoney, mapearam companhias cujo dividend yield anualizado alcançou impressionantes 60% do valor de suas respectivas ações. Para serem incluídas na análise, as empresas precisavam registrar um volume médio diário de negociação superior a R$ 1 milhão nos últimos 12 meses, garantindo a liquidez dos papéis. Abaixo, a lista detalhada dessas companhias e seus respectivos rendimentos:
- Syn Prop Tec (SYNE3): 60,24%
- Sao Carlos (SCAR3): 45,81%
- Allied (ALLD3): 35,86%
- Vulcabras (VULC3): 30,47%
- Marfrig (MBRF3): 27,71%
- Lavvi (LAVV3): 25,55%
- Unipar (UNIP6): 25,46%
- Alpargatas (ALPA4): 22,49%
- Marcopolo (POMO3): 19,66%
- Trisul (TRIS3): 17,32%
- Mitre Realty (MTRE3): 16,26%
- Axia Energia (AXIA3): 15,04%
Rodrigo Santoro, Head de Ações da Bradesco Asset, projeta um expressivo volume de pagamentos de dividendos extraordinários até o final do ano. A expectativa se fundamenta na iminente alteração na tributação sobre a distribuição de lucros, que entrará em vigor no próximo ano. Empresas com reservas significativas de lucro estão anunciando grandes distribuições, e essa tendência deverá se intensificar à medida que buscam assegurar a isenção tributária no período atual.
Com esse movimento, o especialista estima que o dividend yield médio das empresas componentes do Índice Bovespa deverá ascender para um patamar entre 7% e 8%, superando as projeções de 6,5% para o ano subsequente, impulsionado por essas ofertas excepcionais. Santoro observa, no entanto, que raramente uma empresa de grande porte conseguiria oferecer um retorno em dividendos equivalente aos 15% anuais da taxa de juros em condições de mercado usuais. Tais situações se materializam predominantemente em virtude de dividendos com caráter extraordinário.
Ainda segundo Santoro, a comparação do retorno em dividendos deveria, de maneira mais apropriada, considerar o juro real, em vez da taxa nominal da Selic. Ele elucida que, em média, as empresas pagam cerca de 6% de dividend yield por ano, um valor que se alinha à rentabilidade real dos títulos públicos corrigidos pela inflação. Adicionalmente, a valorização intrínseca da ação, ajustada pela inflação, assegura que o ganho do investidor proveniente de dividendos preserve seu caráter real. Ele aponta que, embora existam companhias que distribuam mais de 6% anualmente, outras optam por reter parte do lucro, um capital que, reinvestido, pode se traduzir em maior valorização da própria empresa e de suas ações no longo prazo.
Em relação ao posicionamento do Copom, o Head de Ações avalia que a manutenção da taxa de juros não atuará como um catalisador decisivo para as ações no curto prazo, dado que as projeções de queda nos juros persistem para o próximo ano. Santoro antecipa que a redução da Selic é mais provável para março, mas ressalta que um corte em janeiro não alteraria substancialmente o panorama para a bolsa. Deste modo, o primeiro trimestre do próximo ano se afigura como um período crucial para o mercado acionário, oferecendo maior clareza sobre as tendências dos juros, tanto no cenário doméstico quanto nos Estados Unidos. A perspectiva é de um trimestre potencialmente bastante favorável.
Bruna Sene, analista de Renda Variável da Rico Investimentos, corrobora a possibilidade de rendimentos em dividendos ultrapassarem os 15% anuais, mas ressalta duas ressalvas críticas. Primeiramente, dividend yields que superam esse percentual são incomuns e não detêm garantia de sustentabilidade. Em segundo lugar, frequentemente, esse retorno elevado surge em decorrência de uma desvalorização acentuada do preço da ação ou de um evento singular, como a distribuição de um dividendo extraordinário. Para a analista, o foco do investidor deve se voltar para o “retorno total”, que integra tanto os dividendos quanto as flutuações – positivas ou negativas – no valor da ação. Ilustra que uma ação, apesar de remunerar 16% em dividendos, pode ainda gerar prejuízo se sua cotação desvalorizar em um percentual maior no período analisado.
Imagem: infomoney.com.br
Assim, enquanto retornos acima de 15% são visíveis em momentos específicos, o critério mais relevante é a sustentabilidade dos dividendos. Bruna Sene recomenda uma avaliação minuciosa de indicadores essenciais, como a capacidade de geração de caixa da empresa, a necessidade de investimentos para sustentar seu crescimento, o nível de endividamento, a sensibilidade aos movimentos das taxas de juros, o payout (que representa a fatia do lucro líquido distribuída aos acionistas) e a recorrência desses pagamentos.
Em síntese, com a taxa Selic mantida em 15%, os dividendos encontram-se em concorrência direta com a rentabilidade da renda fixa, tornando a “seletividade” a palavra-chave primordial para o investidor. Contudo, a estratégia de busca por empresas pagadoras de dividendos permanece válida para aqueles que priorizam uma fonte de renda regular, buscam exposição a empresas com fundamentos sólidos e possuem um horizonte de investimento de longo prazo para navegar pelas oscilações do mercado. O presente ano reforça a vital importância da diversificação do portfólio. Mesmo com uma Selic elevada, o Ibovespa acumulou valorização de mais de 30% no período, e o Índice de Dividendos (IDIV) avançou acima de 25%. Esse panorama sublinha que, ainda que juros altos exerçam pressão sobre algumas teses de investimento, companhias bem-posicionadas continuam a entregar valor consistentemente, permitindo ao investidor que diversifica entre renda fixa e variável aproveitar oportunidades sem abrir mão da segurança.
Ricardo França, analista de Investimentos da Ágora Corretora, aponta que se o mercado interpretar o comunicado do Copom com um tom mais “dovish”, sinalizando uma iminente queda dos juros, há margem para uma retração nos juros de curto prazo. Em tal cenário, ativos de risco, como ações e fundos imobiliários, tenderiam a reagir com um movimento mais otimista, embora França preveja que seja um movimento inicial marginal, pois a tese de queda de juros já é amplamente aceita pelo mercado. Para o analista, o real impacto nos investimentos se manifestará à medida que as quedas nas taxas de juros forem efetivamente confirmadas. Historicamente, os ciclos de redução dos juros revelam-se favoráveis para o mercado acionário, com a bolsa de valores registrando valorização em seis dos últimos seis ciclos de cortes, variando em magnitude. França conclui ser improvável apostar em um recuo da bolsa em um cenário de taxas de juros decrescentes.
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Este cenário de desafios e oportunidades no mercado acionário brasileiro demonstra a importância da análise profunda e da diversificação para otimizar os retornos. Mesmo com a renda fixa em evidência, estratégias focadas em dividendos continuam a oferecer um caminho promissor para o investidor que busca crescimento e renda passiva. Para aprofundar a compreensão sobre estratégias de investimento e o cenário econômico brasileiro, acesse as últimas Análises de Economia em nosso portal.
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Crédito da imagem: Economática/Infomoney